Chiloé: um arquipélago surpreendente no sul do Chile


Visitar Chiloé, arquipélago no norte da Patagônia Chilena, possibilita conhecer um Chile "raiz", onde muitas tradições e mitos habitam o imaginário cultural e ainda encontramos paisagens selvagens e locais por explorar pouco desbravados turisticamente. Aqui relatamos uma viagem de 10 dias, percorrendo Chiloé durante aproximadamente uma semana e, posteriormente, a região continental dos Lagos Andinos, próxima a Puerto Varas, Puerto Montt e outras em torno do Lago Llanquihue, detalhadas em outro post.

Partindo de Porto Alegre, nossa origem, assim como de outras capitais brasileiras, atualmente há vôos diretos para Santiago do Chile, com aproximadamente 3 horas de duração. De lá, se pode fazer conexão para a cidade de Puerto Montt, situada ainda no continente, uma viagem de pouco menos de 2 horas de avião. Fizemos nosso percurso até  Chiloé a partir do aeroporto desta cidade, no qual alugamos um carro para os deslocamentos na região. 

Há também vôos diretos de Santiago do Chile para Castro, capital de Chiloé, mas quando verificamos, se mostraram bem mais caros, assim como o aluguel de automóveis na região. Na nossa experiência, valeu a pena partir de Puerto Montt e reservar no final da viagem alguns dias para visitar também a parte continental da Região dos Lagos, especialmente as atrações próximas a  Puerto Varas.

Saindo do aeroporto El Tepual, em Puerto Montt, importante fazer, inicialmente, uma parada em um posto de gasolina, garantindo tranquilidade para chegar ao arquipélago com o tanque abastecido e evitando contratempos. Mas apesar de ter lido sobre inexistência de postos de gasolina na estrada ao desembarcar no arquipélago, eles estão lá, sim. Para chegar à ilha principal de Chiloé, é necessário pegar uma balsa em Pargua, que fica a aproximadamente 60 quilômetros do aeroporto de Puerto Montt, e cruzar o Canal de Chacao, travessia que dura aproximadamente 30 minutos e, ao menos na nossa experiência, costuma ser tranquila e fácil, com pouco tempo de espera e rápido embarque e desembarque de carros e passageiros. 


Você pode optar por ficar dentro do carro ou buscar as partes superiores das balsas. A vista vale a pena e, com sorte, se pode avistar até mesmo golfinhos. Se não derem o ar da graça, a chegada a Chiloé, que é muito interessante, já vale deixar o carro e buscar as laterais da balsa, ainda que a viagem seja breve. Desça já com o casaco, o vento provavelmente estará presente e será uma quase constante na viagem... ao menos, foi nas nossas experiências no arquipélago.

Da chegada na ilha principal, após atravessar o Canal de Chacao, até Quellón, no extremo sul da ilha, há um percurso de aproximadamente 190 quilômetros, se você resolver seguir direto pela famosa Carretera Panamericana, com eventuais desvios para visitar Ancud, Castro e outras atrações imperdíveis do arquipélago. 

Buscando roteiros  turísticos para Chiloé, encontramos muitas passeios tipo "bate e volta" de Puerto Montt ou Puerto Varas, no continente, incluindo atrações como as Pinguiñeras de Puñihuil, próximas a Ancud e eventualmente uma ida a Castro, com suas fotogênicas palafitas. 

Uma pena reduzir Chiloé a um dia e essas visitas, sem dúvida um passeio ao arquipélago vale uma semana de férias, como fizemos. No mínimo, 3 ou 4 dias são necessários para as principais atrações e, neste caso, você não poderá se deter muito em nenhum dos locais ou pequenos vilarejos pelo caminho, que podem tornar a viagem muito pitoresca e agradável. Sentir o "clima" de Chiloé exige pernoites na ilha, desfrutando de seu ritmo. 

Chiloé também se tornou conhecida, mais recentemente, como cenário do livro "El Cuaderno de Maya", de Isabel Allende, que havia lido alguns anos antes da minha primeira visita e tinha adorado. No romance, a adolescente é enviada para Chiloé pela avó, para escapar das drogas e traficantes, e se depara com a vida pacata em uma pequena ilha do arquipélago, de difícil acesso. Há quem a visite especificamente para conhecer os cenários descritos no livro, mas não é um passeio feito de forma fácil, envolvendo transporte por terra e mar. Nós declinamos desta parte, mas sem dúvida, o livro foi parte importante do meu interesse pela região...

De modo geral, diria que uma viagem à região de Chiloé fica bem menos confortável se você não dispuser de um carro, de modo que, sendo possível, vale a pena alugar um, o que garante liberdade de conhecer pontos não tão turísticos e divulgados e que valem enormemente a visita. As estradas são boas, quase sempre de pista simples mas bem pavimentadas e sinalizadas. O trânsito flui bem e é possível fazer trechos de 90 ou 100 quilômetros para conhecer diferentes localidades com facilidade. A exceção fica para o tráfego nos arredores de Castro, onde quase sempre se encontra um trânsito pesado e lento. Nunca demorávamos menos de 20 ou 30 minutos para cruzar este trecho durante o dia ou no final de tarde (a noite é tranquilo). Mas não chega a prejudicar, de fato, o deslocamento pela ilha principal, quase sempre em estradas boas e, dependendo da direção, com direito à vistas muito bonitas do Pacífico ou dos vulcões que se pode avistar, na cordilheira, no continente, com neve no cume mesmo no auge do verão. 

Para as ilhas menores, é necessário novamente tomar balsas, para o que não encontramos dificuldades. Você embarca  com o carro e segue ao desembarcar pelas estradinhas aos povoados e cidades menores. 

No verão, são comuns também festas típicas nas diferentes cidades e vilarejos, uma das experiências mais interessantes que tivemos no arquipélago, com direito à comida típica, danças, jogos e brincadeiras. Vale a pena conferir o calendário e visitar ao menos alguma.

Sendo basicamente uma ilha grande com pequenas ilhotas próximas, Chiloé conta um lado "protegido", com mar tranquilo e mais voltado para o continente, onde estão as principais cidadezinhas e outro com as praias deslumbrantes, bravias e geladas do Pacífico, com muitas ondas e ventos praticamente constantes e cortantes. Este lado da ilha é bem menos explorado, há poucas localidades e hotéis e muitas das praias são praticamente inacessíveis por terra. Mas uma visita a ele é impressionante e vale a experiência. Não espere porém um banho de mar, ao menos que você seja daqueles que enfrentam a água em qualquer temperatura. Costuma ser gelado e o vento normalmente não ajuda...

Em Chiloé, você encontrará muitos passeios indicados nos guias turísticos e outros que podem ser escolhidos conforme os diferentes interesses, singulares. O arquipélago é conhecido pelas palafitas e pelas igrejas, reconhecidas como Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, construções típicas do estilo chilote, tradicional na ilha, e alguns roteiros inclusive traçam especificamente percursos para visitar a maior quantidade possível delas nas diferentes cidades. Interessante, mas não seguimos esta proposta, especificamente, embora muitas delas valham muitíssimo a visita e devam ser incluídas no roteiro...

É possível ainda, muitas surpresas, com restaurantes, praias, feiras ou simplesmente caminhadas deliciosas na orla das diferentes cidadezinhas que se pode encontrar em um passeio pelas ilhas. No nosso caso, sendo fevereiro (aliás, passamos lá o Carnaval, que no Chile não é comemorado), o verão e o por do sol em torno de 21h30 tornavam os dias longos e com possibilidades de muitos passeios. Já quanto ao clima, não chega a fazer propriamente calor e, à noite, a temperatura muitas vezes cai muito. Se vê alguns turistas, majoritariamente  chilenos, aventurando-se nas praias, especialmente as mais tranquilas, voltadas para o continente, mas o Pacífico é conhecido por águas frias e a temperatura ambiente dificilmente convida a um banho de mar, em Chiloé. A noite (e até durante alguns dias), mesmo no verão, não é nada incomum fazer realmente frio, com temperaturas inferiores a 10º C e casacos e blusões certamente serão mais úteis na mala do que biquinis e roupas de praia. 

Nós, após desembarcarmos em Chiloé, uma vez cruzado o Canal de Chacao, fizemos uma primeira parada de uma noite em Ancud (aproximadamente 100 quilômetros do aeroporto de Puerto Montt), que utilizamos como base para passeios iniciais. Depois, ficamos mais cinco noites na Peninsula de Rilán, nas proximidades de Castro, atual capital do arquipélago e situada na região central da ilha principal. É nesta península que se situam muitos dos principais hotéis da ilha maior (muitos deles mais rurais, mas ainda assim, sofisticados) e, a partir deste local, fizemos os demais passeios, inclusive para o extremo sul da ilha, onde está a cidade de Quellón e o início da Rodovia Panamericana. A vista de Castro que se tem a partir da Peninsula de Rilán, especialmente do hotel em que estávamos, é muito bonita.

A rede hoteleira e turística do arquipélago é boa, embora relativamente cara, mas há peculiaridades como, por exemplo, dificilmente se encontrar hotéis com amenidades como frigobar ou cafeteiras nos apartamentos. A explicação que nos deram é que, sendo uma ilha, o abastecimento é mais caro e complicado. Também não é incomum, o que me pareceu bastante peculiar, a cobrança pelo uso de toiletes em lugares turísticos, inclusive alguns em locais pelos quais você pagou previamente um ingresso.

Vale destacar, como ponto forte de uma visita ao arquipélago, a culinária típica chilote, com forte influência mapuche e espanhola. A batata, em suas múltiplas variações de preparo e tipos (dizem que chegam a 400), está bastante presente, bem como peixes e carnes. O curanto en hoyo é o prato mais conhecido e a oportunidade de vê-lo em preparação em uma das festas típicas, na Isla Lemuy, em uma viagem anterior, foi sensacional. As cozinheiras, empáticas talvez com meu entusiasmo, me mostraram a forma como é elaborado. Na versão original, o prato é preparado sobre buracos cobertos por pedras quentes em cima das quais se cozinham os ingredientes, cobertos por folhas: mariscos, batatas, porco, frango, linguiça, entre outros. Claro que há versões preparadas em panelas, que se encontram com facilidade nos restaurantes. Eu adoro experimentar pratos típicos e me deliciei com este mais de uma vez. Bolinhos de batata, chamados milcao, muitas vezes acompanham o curanto, mas também podem ser encontrados "avulsos" nos mercados e restaurantes. Via de regra, as porções de curanto são enormes, é uma experiência para fazer em grupo! Também são típicas as cazuelas, ensopados com diferentes variações e os chapaleles, espécie de pão típico. O salmão também está bastante presente nos restaurantes e nas polêmicas, visto que o Chile, um dos maiores produtores mundiais, sofre muitas críticas pela forma como é cultivado e Chiloé já esteve mais de uma vez sob os holofotes nestas discussões. 

Aproveite para degustar todos os pratos típicos... eu, metida que sou a experimentar receitas, tentei elaborar caseiramente vários destes pratos (com exceção do curanto!). A experiência deixa muito a desejar, em relação as produções feitas com a expertise local! E nas aventuras culinárias na ilha, claro, o licor de oro completa a experiência, não deixe de provar...

Nossos dias de viagem em Chiloé foram distribuídos mais ou menos da seguinte forma:

Dia 1 - Travessia do continente para o arquipélago; chegada em Ancud; Pinguiñeras de Puñihuil e praias próximas.

Dia 2 - Passeio por Ancud; Parque Ecologico Y Mitologico de Chiloe; Isla Aucar; Quemchi; Peninsula de Rilán (onde se localizava nosso hotel e muitos dos demais próximos à capital, Castro). 

Dia 3 - Lago Huillinco; Playa de Cucao; Muelle de las Almas; Castro (jantar no porto, o que se tornou uma deliciosa rotina) e volta para o hotel (com direito a uma lua espetacular pela estrada principal e estradinhas até chegar).

Dia 4 - Dalcahue; Isla de Quinchao (dirigindo até Chequián - no extremo da ilha - e voltando por Quinchao; Achao; Curaco de Vélez); Dalcahue; volta para o hotel.

Dia 5 - Quellón; Playa Punta Lapas (e marco zero da Rodovia Panamericana); Parque El Pudu; Castro e hotel.

Dia 6 - Castro - museus e passeios pela cidade e Mercado de Artesanato; vilarejo de Rilán, hotel.

Dia 7 - Já no caminho rumo a volta para o continente:  Quemchi; Linao; Manao; Chacao e travessia de balsa para o continente, rumo a Puerto Varas.

Alguns dos passeios aqui citados e detalhados abaixo, seguiram as tradições turísticas e indicações dos guias e roteiros sobre o arquipélago. Outros inventamos, improvisamos e nos permitiram, muitas vezes, descobrir preciosidades pouco divulgadas. Comentarei aqui algumas das impressões sobre nosso roteiro e os locais que visitamos.


Ancud, nossa primeira parada, a antiga capital da ilha, é uma cidade simpática, que pode ser visitada em algumas horas. 

A orla permite uma caminhada e, já na primeira visita que fizemos, há alguns anos, me impressionou a convivência próxima do arquipélago com a força do mar, intensificada pelas condições geológicas do Chile e certa frequência de terremotos, maremotos e, consequentemente, tsunamis. Há sirenes para alerta sobre tsunamis e se pode visitar o monumento erguido para as mais de 1600 vítimas do Terremoto de Valdívia, com epicentro a cerca de 300 quilômetros do arquipélago, que atingiu excepcionais 9,5 graus na escala Richter e é considerado o mais violento tremor já registrado no planeta. 

Em 2024, o trecho da orla estava em obras e em muitas partes não se podia transitar a pé na beira do mar, mas uma visita anterior, em 2017, pudemos percorrer a "costanera" em boa parte de sua extensão. Muito agradável o local. 

 

No centro há o obrigatório Mercado Municipal de Ancud, com alimentos, artesanato e barraquinhas de souvenirs. O trabalho em lã é uma das especialidades do arquipélago e se encontra no local, em grande quantidade, objetos feitos deste material e, é claro, roupas. Arte em fibras e madeira também é ponto forte de Chiloé. 


A cidade é basicamente construída no estilo chilote, com casas de madeira e estruturas resistentes a abalos sísmicos e a visita é agradável, mas pode ser feita em poucas horas. 

Ancud é o ponto de partida para uma das principais atrações de Chiloé, a visita às Pinguiñeras de Puñihuil. Não é difícil contratar o passeio da cidade, no caso de você não estar de carro e, se estiver,  também não é difícil se deslocar à praia de onde partem os barcos para o passeio, a aproximadamente 25 quilômetros do centro,  e comprá-lo diretamente lá. O caminho é tranquilo e já vale o passeio, com vistas deslumbrantes para a parte aberta do Pacífico. 

Próximo a praia há múltiplos estacionamentos, restaurantes e operadoras que fazem o passeio, que dura em torno de 40 minutos, permitindo, nos  meses de verão, o avistamento de pinguins de Magalhães e Humboldt. 

 

É um programa muito agradável e, em duas viagens a Chiloé, fizemos 3 vezes visitas aos simpáticos animais. Tendo sido o nosso primeiro passeio nesta viagem, precedido por um trajeto que entre dois vôos e aeroportos tomou quase uma noite e complementado por uma ótima refeição em um dos restaurantes da praia, foi onde encerramos nosso primeiro dia de viagem, antes de retornar, não sem certa dificuldade devido ao sono batendo, até nosso hotel, nos arredores de Ancud. 

O dia seguinte iniciou com uma visita a Ancud e, em seguida, um pequeno trajeto de aproximadamente 20 quilômetros até o Parque Ecologico Y Mitologico de Chiloé, que já havíamos visitado anteriormente, então ainda guiados por Don Filiberto Labarca, seu criador e artesão, falecido há alguns anos. Não é um passeio longo, mas, especialmente para crianças, pode ser uma ótima maneira de iniciar-se nos mitos e cultura local. Você vai conhecer, entre outras, as lendas que farão parte de sua viagem, frequentemente mencionadas e lembradas nas denominações de restaurantes, hotéis, etc. O Trauco, a Pincoya, o Caleuche e outros seres mitológicos vão se apresentar ao longo de um breve caminho guiado, com direito a explicações sobre a origem dos mitos.

O parque fica na Carretera Panamericana, entre a chegada ao arquipélago e Ancud, de modo que teria sido possível visitá-lo no primeiro dia, mas não quisemos perder a oportunidade de fazer o passeio às pinguiñeras em um lindo dia de sol, assim, preferimos voltar até o local no segundo dia.

Nosso próximo destino, a Isla Aucar, localizada na cidadezinha de Quemchi, é um ponto turístico "badalado" do arquipélago. Chegamos à tarde e não tivemos dificuldades para estacionar e visitar a ilha, a qual se chega por uma passarela de aproximadamente 500 metros. 

 

Lá, se encontra a pequena capela de Nossa Senhora da Merced, ao lado de um cemitério e um parque. Vários pássaros, entre eles o cisne de pescoço negro, compõe o cenário. O lugar é muito bonito e tranquilo e, não à toa, associado por muitos a experiências místicas. Vale a visita. 

 

Próximo a Quemchi se pode visitar também as Cascadas de Tocoihue, mas não as conhecemos pois já queríamos chegar ao hotel e a Peninsula de Rilan, onde se localizava, prometia estradinhas de terra e caminhos que temíamos não serem tão fáceis caso a noite caísse. A dificuldade não se confirmou e, depois, muitas vezes fizemos trajetos pela península inclusive bem tarde, à noite (o que é bem fácil de acontecer pois com o dia terminando tarde, se janta tarde e, logo, muitas vezes quando víamos já passava das 23h e acabávamos de terminar a refeição, ainda em outra cidade...).

Os passeios pela península de Rilán valem a pena também, há muitas pequenas vilas simpáticas, restaurantes locais, pequenas praias. Nosso hotel chegava, após uma caminhada, até a beira do mar e dedicamos algum tempo a essa aventura no dia seguinte, ainda pela manhã. 

Nosso objetivo seguinte, o Muelle de las Almas, no lado da ilha principal aberto para o oceano, acabou empregando a maior parte do dia no projeto e nos rendeu aventuras de carro por estradas bem menos estruturadas, caminhadas por morros e muitas risadas. Minha opinião: vale mais o trajeto do que o ponto final... passamos pelo Lago Huillinco no caminho, local muito bonito e chegamos a Playa de Cucao, muito típica das praias do Pacífico... pedras, ondas altas, vento, praticamente deserta. 

No alto do morro próximo à praia e já na direção do Muelle de las Almas, comemos em um restaurante delicioso e enfrentamos em seguida a estrada pelos morros (aproximadamente 10 duros quilômetros) para chegar ao estacionamento onde se deve deixar o carro e seguir a pé para o Muelle. 

Não é um passeio para quem tem medo de colocar o carro em estradinhas de terra arenosa ou de subir morros caminhando... o local também não conta com grande estrutura, como sanitários e restaurantes. Mas o passeio é feito por muitas pessoas e nos surpreendeu a diversidade do público, muitas famílias com crianças pequenas, inclusive. Do estacionamento até o Muelle há uma caminhada de pouco mais de meia hora, mas por terreno com muitas subidas e descidas. Importante um bom tênis ou calçado próprio para a finalidade.


O caminho, sem dúvida, vale a pena, com inúmeras paisagens grandiosas, sempre com o mar ao fundo e muitos locais para fotografias. O Muelle que dá nome ao passeio, no entanto... bem, é uma plataforma perfeita para fotos instagramáveis, desde que você tenha disposição de esperar (e muito) em uma fila.


Quando fomos, não seria menos de uma hora de espera, talvez. Gera fotografias em que você estará sozinho com o mar ao fundo, mas obviamente a sensação é absolutamente ilusória, visto que haverá, do lado oposto ao clicado, um  número incontável de criaturas esperando sua vez para fazer o mesmo. Nós preferimos outras fotos, visto que há vários locais muito fotogênicos pelo caminho e pulamos esta parte... Mas nos divertimos muito olhando o movimento no Muelle!

Já retornando, depois de pegar o carro no estacionamento e cruzar a parte mais aventuresca da estrada de terra rumo a Castro, paramos ainda novamente para curtir a vista da Playa de Cucao, com caminhada pelas pedras e tentação de esperar o final do dia para ver um por do sol no mar. 

Mas como o caminho de volta para casa era longo e o sol se põe tarde, resolvemos retornar, bordeando com calma o Lago Huillinco. 


Também é desta região que se parte para visitar o Parque Tepuhueico, um passeio muito interessante e com relativa estrutura que permite avistar aves e diferentes espécies de plantas do arquipélago e que, desta vez, não fizemos, já que o tínhamos conhecido há alguns anos. 

A noite chegando e como o cardápio do restaurante do hotel estava com preços bem mais salgados devido ao Dia de San Valentín (comemoração de dia dos namorados em boa parte dos países mundo afora), optamos por uma parada no porto de Castro, que nos apresentou um dos tantos restaurantes com pratos típicos e saborosos, que se tornaram nosso programa de final de tarde favorito no arquipélago, sempre experimentando algo novo. 

Nosso projeto no dia seguinte era chegar até a ponta extrema da Isla Quinchao, atravessando para ela por uma balsa partindo de Dalcahue. 

Foi um excelente passeio, com direito a pequenos vilarejos no caminho, cenários de praias desertas com os vulcões ao fundo e comida local no restaurante mais "raiz" que visitamos no arquipélago. Meu espanhol, de modo geral, é suficiente para uma conversa, mas lá, não entendi duas em cada dez palavras enunciadas pelo proprietário do estabelecimento, que nos recebeu com extrema simpatia e disposição para a comunicação... uma pena. 

Na Isla Quinchao fica a localidade de Curaco de Vélez, atração turística em muitos passeios recomendados e disponibilizados pelas operadoras locais. Portanto, fizemos nossa parada obrigatória na pequena vila. Não achamos mais interessante do que tantas outras do arquipélago e mesmo desta ilha. Particularmente, gostei mais, por exemplo, de Achao, com sua simpática orla, os corajosos banhistas dispostos a enfrentar a água fria, uma pequena feira de artesanato e muitos restaurantes e bares.

Já de volta à ilha principal, passeamos por Dalcahue, uma das cidades maiores da ilha (depois de Castro, Ancud e Quellón), com seus aproximadamente 13 mil habitantes. A tradicional igreja está presente nas proximidades da praça e merece uma visita, bem como a Feria Artesanal de Dalcahue, uma das principais e mais turísticas do arquipélago.  No verão, como foi o caso da nossa visita, o local, na Costanera, estava repleto de turistas e também população local, se divertindo com jogos, música. Clima muito festivo. De Dalcahue se pode também fazer vários passeios de barco, mas não os experimentamos nesta viagem.

 

Ao lado, ainda encontramos as Cocinerias, parada obrigatória para experimentar mais algum dos inúmeros pratos típicos locais. São inúmeros balcões e restaurantezinhos nos quais você escolhe o que quer comer.

Nossa proposta, no dia seguinte, era chegar a Quellón, uma das cidades "grandes" do arquipélago, com pouco mais de 27 mil habitantes. Foi nosso "bate e volta" mais longo, visto que o município se localizava a aproximadamente 100 quilômetros do nosso hotel e nunca havíamos ido tão ao sul. Quellón é menos turística, pela distância, do que Castro, Ancud ou Dalcahue e temíamos estradas de pior qualidade, mas a viagem foi bem tranquila. A cidade ficou conhecida pela participação na história do cultivo de salmão, hoje criticado nos moldes então realizados,  e por ter sido bastante atingida por um terremoto de magnitude 7,7 em 2016, logo anterior a nossa primeira visita a ilha. Hoje, parece tranquila, de ritmo lento. Local de onde partem navios para o sul da Patagônia e outros pontos do continente e se pode fazer um passeio interessante de algumas horas.  

Mas, talvez pela lembrança do terremoto de 2016 presente, me surpreendi e achei assustadoras as nuvens de cor marrom que cobriam o mar quando avistamos a cidade na chegada, complementadas por um nevoeiro denso que brincamos ser relacionado ao Caleuche, o barco fantasma que ronda o imaginário e mitos locais. De forma mais prática, temi que fosse fumaça dos incêndios que, naqueles dias, assolavam todo o Chile, inclusive com estragos importantes perto de Santiago. Ou ainda talvez alguma atividade de um dos vulcões que se pode avistar no continente e que, de Quellón, parecem próximos. Mas me explicaram que não se tratava de nada extraordinário, ainda que estivesse um pouco mais intenso neste dia comum em Quellón e, portanto, nos desaconselharam passeios marítimos para avistamento de baleias, que são uma das atrações locais. 

Nossa visita a cidade foi breve, apenas demos uma caminhada pela orla e conhecemos a região do porto para, em seguida, fazermos o breve percurso de carro até a Playa Punta Lapas. Lá, as fotos obrigatórias no Hito Cero da Carretera Panamericana, que partindo daí chega ao continente e segue por aproximadamente 30 mil quilômetros até o Alasca, obviamente interrompida em alguns trechos pelo oceano. 

 

Nossa ideia a partir de lá era conhecer o Parque Tantauco, próximo da cidade, mas uma visita ao Centro Turístico na orla, onde fomos muitíssimo bem recebidas, nos fez mudar de ideia, considerando a neblina intensa, que atrapalharia o passeio, e iniciar a viagem de volta para Castro, parando no meio do caminho no Parque El Pudu, que fica no lado mais protegido da ilha. Foi uma ótima opção, ainda que demande sair da estrada principal e pegar algumas estradinhas de terra, mas pelas quais foi bem possível transitar.

O Parque El Pudú não tem o apelo turístico de outros locais da ilha, mas vale muito o passeio. Fomos recebidas e orientadas sobre a visita, por dentro da mata, mas com muita sinalização e estrutura para os visitantes, como trilhas, cordas, pontes e sanitários, disponíveis no início das trilhas. Não vimos os pudus, mamíferos de pequeno porte que se parecem um pouco a veados e, supostamente, são comuns por aí. Mas nos deparamos com muitas paisagens lindas e desertas na beira do mar, aqui com a aparência de um grande lago tranquilo. 

 

Muitas aves, como os cisnes, deram o ar da graça e adoramos a visita. De quebra, nos deparamos com o Muelle el Pudú, este sim deserto e tranquilo e nos divertimos fazendo as fotos que o Muelle de las Almas não tinha favorecido... Novamente voltamos praticamente com a noite fechada e Castro foi nossa parada para o jantar. 

O último dia na ilha estava chuvoso e frio e resolvemos aproveitá-lo em Castro, com visita a simpática e fotogênica Iglesia de San Francisco, construção chilote típica e cartão postal de Chiloé, além de museu anexo. O interior, todo em madeira, é particularmente interessante.

  

Concluímos a visita a Castro no Mercado Artesanal Los Palafitos, pelo qual havíamos feito breves passadas ao realizar as refeições próximas a costa e ao porto, para as comprinhas de praxe. Deste local, também são feitos vários passeios de barco pela região, mas o clima definitivamente não convidou e preferimos caminhar pela cidade e atrações desta, eventualmente fugindo da chuva que, pela primeira vez desde nossa chegada ao arquipélago, se fez realmente presente e incômoda. 

Já conhecíamos Castro de outros passeios e da viagem anterior e havíamos feito várias fotos das palafitas, típicas e cenográficas representações do arquipélago, nas passagens ao cruzar a cidade durante o tempo na ilha, de modo que acabamos resolvendo usar o final do dia para um passeio pela Península de Rilán e visita ao vilarejo de mesmo nome, onde não podia faltar a igreja local. 

No dia seguinte e já rumo ao continente, optamos por fazer um caminho pela costa ao invés de seguir pela estrada principal até as proximidades de Ancud. Foi uma ótima pedida, com nova passagem por Quemchi e outras cidadezinhas, até chegarmos a Chacao e nos prepararmos para atravessar o canal e deixar Chiloé, rumo ao continente e a segunda parte da viagem. 

Mais uma vez, adorei ter estado no arquipélago e, apesar de ter passado nele mais dias do que a maior parte dos turistas opta por fazer, fiquei com a sensação de que ainda muito haveria por conhecer. Espero, portanto, em algum momento retornar a Chiloé. Dizem que é mágica e que encanta os viajantes, que querem sempre voltar... acredito!

Experiências de viagem realizada em fevereiro de 2024, complementadas por visita anterior à região em janeiro de 2017.


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